A Dança do Dar e Receber: Equilíbrio nas Relações sob a Ótica das Ordens do Amor e da Teoria da Troca Social
A dinâmica das relações humanas é um tema fascinante e complexo, permeado por trocas constantes. Seja em âmbito familiar, amoroso ou social, a forma como damos e recebemos influencia profundamente a saúde e a longevidade desses laços. Neste artigo, mergulharemos no conceito fundamental de "Dar e Receber" sob a perspectiva das Ordens do Amor de Bert Hellinger e o compararemos com a Teoria da Troca Social na psicologia, buscando similaridades e explorando as possíveis origens da visão de Hellinger.
O Equilíbrio Essencial: Dar e Receber nas Ordens do Amor de Bert Hellinger
Para Bert Hellinger, o "Dar e Receber" é uma das três ordens fundamentais do amor que governam os sistemas familiares e outros relacionamentos. Essa ordem postula que, para um relacionamento prosperar, deve haver um equilíbrio dinâmico entre o que é dado e o que é recebido.
- A Necessidade de Equilíbrio: Hellinger observou que, quando recebemos algo de alguém, sentimos uma necessidade intrínseca de retribuir com algo de valor semelhante. Essa troca mantém o fluxo e a vitalidade da relação. Sentir-se em dívida gera um desconforto que nos impulsiona a restaurar o equilíbrio.
- Dar e Receber com Amor: Em relacionamentos íntimos, como entre parceiros, o dar e receber transcende a mera equivalência. O amor impulsiona a dar mais do que se recebeu, gerando um ciclo crescente de troca e aprofundamento do vínculo.
- Desequilíbrios e suas Consequências: Quando o equilíbrio é rompido, seja por dar demais (acima da capacidade ou desejo do outro de retribuir) ou por receber consistentemente mais do que se oferece, o relacionamento tende a se desestabilizar. Quem recebe demais pode se sentir inferiorizado ou sobrecarregado, enquanto quem dá demais pode se sentir explorado ou ressentido. Em casos extremos, esses desequilíbrios podem levar ao afastamento e ao término da relação.
- A Exceção na Relação Pais e Filhos: Hellinger destaca que a dinâmica do dar e receber é diferente na relação entre pais e filhos. Os pais dão a vida e o essencial para o desenvolvimento dos filhos, algo que estes nunca poderão retribuir na mesma medida. Em vez de retribuir diretamente aos pais, o equilíbrio se estabelece quando os filhos passam adiante o que receberam, especialmente para seus próprios filhos, servindo à continuidade da vida.
A Teoria da Troca Social: Uma Perspectiva Psicológica sobre o Equilíbrio nas Relações
A Teoria da Troca Social, amplamente utilizada na psicologia social e nas relações interpessoais, oferece uma perspectiva interessante para comparar com o conceito de Hellinger. Essa teoria postula que as relações humanas são formadas e mantidas com base em uma análise de custos e benefícios. As pessoas são motivadas a buscar recompensas e evitar punições em suas interações sociais.
- Recompensas e Custos: Nas relações, as recompensas podem incluir apoio emocional, companhia, recursos materiais, aprovação social, entre outros. Os custos envolvem o tempo, o esforço, os recursos investidos e as possíveis consequências negativas da relação.
- Avaliação e Comparação: Os indivíduos avaliam suas relações comparando as recompensas e os custos com suas expectativas (nível de comparação) e com as alternativas disponíveis (nível de comparação para alternativas).
- Equidade e Satisfação: A teoria sugere que a satisfação e a estabilidade de um relacionamento estão ligadas à percepção de equidade na troca. Se os custos superam as recompensas ou se a troca é percebida como injusta, a relação pode se deteriorar. A reciprocidade é fundamental para essa percepção de equidade.
Similaridades e Pontos de Contraste:
Ao compararmos as Ordens do Amor de Hellinger e a Teoria da Troca Social, encontramos pontos de convergência e divergência:
- Ênfase no Equilíbrio e Reciprocidade: Ambas as perspectivas destacam a importância do equilíbrio nas trocas para a saúde dos relacionamentos. A reciprocidade é um elemento central em ambas, embora a forma como é entendida e expressa possa variar.
- Consequências do Desequilíbrio: Tanto Hellinger quanto a Teoria da Troca Social reconhecem que o desequilíbrio nas trocas pode levar à insatisfação, ao ressentimento e, em última instância, ao término da relação.
- Natureza da Troca: Hellinger abrange um espectro mais amplo de trocas, incluindo aspectos emocionais, sistêmicos e até mesmo inconscientes, enquanto a Teoria da Troca Social tende a se concentrar em recompensas e custos mais tangíveis e conscientes.
- Relação Pais e Filhos: A Teoria da Troca Social pode analisar a relação pais e filhos em termos de investimento e recompensas a longo prazo, enquanto Hellinger enfatiza a natureza única dessa relação, onde a retribuição direta não é esperada, mas sim a transmissão do que foi recebido para a próxima geração.
- Nível de Consciência: A Teoria da Troca Social geralmente assume um certo nível de consciência e racionalidade nas avaliações das trocas, enquanto Hellinger frequentemente explora dinâmicas inconscientes e sistêmicas que influenciam o dar e receber.
As Raízes da Sabedoria Sistêmica de Hellinger: Observação e Influências
A questão sobre as origens do conceito de "Dar e Receber" em Bert Hellinger é complexa. Embora não haja uma única fonte acadêmica que ele cite como a base exclusiva para essa ideia, é provável que ela tenha se desenvolvido a partir de uma combinação de fatores:
- Observação Clínica: A extensa experiência de Hellinger como psicoterapeuta e facilitador de grupos de constelações familiares certamente desempenhou um papel crucial. Suas observações das dinâmicas familiares e dos padrões que se repetiam em diferentes sistemas o levaram a identificar princípios fundamentais como o do dar e receber.
- Influências Filosóficas e Teológicas: A formação inicial de Hellinger como padre católico e sua posterior imersão em filosofia podem ter contribuído para sua visão sistêmica e sua compreensão das dinâmicas relacionais.
- Diversas Abordagens Psicoterapêuticas: Hellinger estudou e praticou diversas abordagens psicoterapêuticas, incluindo a psicanálise, a terapia Gestalt, a terapia primal e a análise transacional. Essas influências podem ter contribuído para a sua compreensão da importância do equilíbrio e da reciprocidade nas relações. A própria análise transacional, com o conceito de "strokes" (reconhecimento), aborda a necessidade de troca e reconhecimento nas interações.
- Sabedoria Popular e Cultural: A ideia de reciprocidade e de "dar e receber" é um tema recorrente em diversas culturas e tradições filosóficas ao longo da história. É possível que Hellinger tenha se inspirado também nessas fontes mais amplas de sabedoria humana.
- Alfred Adler: É importante notar que Alfred Adler já utilizava o termo "constelação familiar" para se referir à dinâmica e ao senso de pertencimento dentro de uma árvore genealógica, o que pode ter influenciado Hellinger em sua abordagem sistêmica.
Embora seja difícil rastrear uma única fonte definitiva para o conceito de "Dar e Receber" de Hellinger, é provável que ele tenha emergido de uma síntese de suas observações clínicas, suas diversas influências intelectuais e uma profunda compreensão das dinâmicas humanas. Sua abordagem, embora rica em insights, nem sempre se alinha com a metodologia científica tradicional, sendo mais baseada na fenomenologia e na observação de padrões.
Conclusão:
Tanto as Ordens do Amor de Bert Hellinger quanto a Teoria da Troca Social da psicologia nos oferecem valiosas perspectivas sobre a importância do equilíbrio nas relações através do dar e receber. Enquanto Hellinger explora as dinâmicas muitas vezes inconscientes e sistêmicas que regem esses fluxos, a Teoria da Troca Social oferece uma análise mais focada nas recompensas e custos conscientes das interações. Compreender ambas as abordagens pode enriquecer nossa visão sobre a complexidade dos relacionamentos humanos e nos guiar na busca por trocas mais saudáveis e equilibradas em nossas vidas.
Referências:
- Hellinger, B. (2006). Ordens do Amor: Um Guia para o Trabalho com Constelações Familiares. Editora Cultrix.
- Thibaut, J. W., & Kelley, H. H. (1959). The social psychology of groups. John Wiley & Sons.
- Homans, G. C. (1958). Social behavior as exchange. American Journal of Sociology, 63(6), 597-606.
- Wikipedia. Social exchange theory.
https://en.wikipedia.org/wiki/Social_exchange_theory - Hellinger.com. 3rd Basic Order: Balance.
https://www.hellinger.com/en/familienstellen/basic-orders-of-life/3rd-basic-order-balance/
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